quarta-feira, maio 02, 2007

Pressupostos para legalidade da prisao em flagrante

Os pressupostos da prisão em flagrante
por Rafael Pereira de Albuque
Ninguém pode ser preso, salvo em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade competente. Mas quando ocorre a prisão em flagrante delito? Quais os critérios que devem ser observados para revesti-la de legalidade? E quem pode prender? Quem pode prender A princípio, qualquer pessoa do povo pode prender quem se encontre em situação de flagrante. A polícia, contudo, tem o dever de ofício de executar a prisão em flagrante. Ou seja, o cidadão comum pode prender, mas não tem obrigação de fazê-lo, já os policiais, mesmo na folga, não pode se esquivar de efetuar a prisão, desde que não haja motivo que justifique a inércia. Por exemplo, um policial só não tem a obrigação de prender uma gangue de assaltantes, pois a sua iniciativa seria inútil e somente correria risco de vida. Quando ocorre o estado de flagrância Estado de flagrância são as circunstâncias previstas no artigo 302 CPP, quais sejam: Art. 302 - Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal; II - acaba de cometê-la; III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração. Os dispositivos desse artigo obedecem aporte de ordem gradativo cronológica. Dessa forma para se penetrar na fase seguinte – inciso posterior, é mister seja superada a fase anterior. Assim é impossível configurar a situação do inciso seguinte sem cogitar a presunção do inciso anterior. A medida em que se avançam as fases, o valor probatório diminui, e as fases anteriores passam a ser presumidas. O escopo do instituto é alcançar quem se encontra “praticando o delito”, todavia, admite outras situações que, por estar diretamente relacionadas ao delito, autorizam lançar mão do jus libertadis do suposto agente. Por isso os dispositivos obedecem a uma hierarquia probatória, que se estende do inciso I, o mais eficaz, ao inciso IV, de menor teor probatório. Inciso I Ocorre no exato momento em que o agente está executando a ação delituosa. Essa fase é a que impregna maior carga probatória, pois o agente foi surpreendido no instante da execução. Suas características variam conforme a natureza da infração. Há crimes, cuja execução pode se prolongar por horas, dias ou até anos, no caso dos crimes permanentes. Por outro lado, em crimes como o furto e roubo “assalto” ou blitz, de ação instantânea, essa fase pode se entender por apenas alguns minutos. Essa etapa do estado de flagrância diz respeito à execução propriamente dita e não abrange a fase de cogitação ou os preparos, exceto nos crimes de mera conduta ou formais, nos quais a própria intenção do agente, contanto explícita, é o suficiente para caracterizar esta fase. Esta fase denomina-se flagrante próprio e, em termos de probabilidade, tem precedência sobre as demais. Neste estágio o crime não se consuma pelo fato do agente ter sido abordado no momento em que desenvolvia o evento delituoso. Neste sentido, é regra que a prisão do agente nos moldes deste dispositivo apenas comporta a tentativa, porquanto o mesmo não concluiu a execução e a prisão se deu “enquanto” se praticava o delito. Inciso II È quando se deflagra a prisão “após” ele ter finalizado todos os passos da execução, ou seja, quando o agente encerra a ação. Nesta etapa, ele não direciona qualquer esforço ao objeto do crime. Neste caso, o agente pode ser preso desde que ainda se encontre no local onde foi realizada a ação. Se houver evasão, essa fase se consuma e inicia a seguinte. O objeto é a exaustão da execução. Também se designa flagrante próprio. Inciso III O condão dessa etapa é a fuga do agente e a sua perseguição emergente. O termo perseguição não é genérico, e aborda uma definição técnica, cujos requisitos são disciplinados pelo parágrafo 1º do artigo 290 CPP: § 1º - Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando: a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido de vista; b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço. Para haver a perseguição é necessário que executor tenha avistado o agente e o persiga sem interrupção. Mesmo que o executor, após tê-lo avistado, o perca de vista, a perseguição, ainda assim, pode ter prosseguimento, contanto que ele fique sabendo a direção a qual o agente tomou, há pouco tempo, sendo que, neste ritmo emergente, deve permanecer no encalço do mesmo. É mister que o executor o tenha avistado pessoalmente após o cometimento da ação, não se prestando para tais fins a informação de terceiro de quem seja o agente. Entretanto, tendo avistado no momento em que ele executava a ação e iniciado a perseguição, caso o perca de vista, o executor pode se basear nas informações de pessoas ou coleta de indícios, de modo a permanecer no seu encalço. Mas é preciso tê-lo avistado “praticando a ação”. Ou então, orientado por quem tenha visto. A perseguição precisa ser continua e emergente. Do contrário não se admite como estado de flagrância se o executor não souber o paradeiro do agente. As buscas aleatórias não caracterizam estado de flagrância. Esta etapa denomina-se flagrante impróprio e, por conseguinte, abrange menor valoração da prova em relação às duas anteriores. Inciso IV De todas as fases do estado de flagrância é a que abarca menor valor probatório. Chama-se flagrante presumido e se caracteriza pelo fato de alguém se encontrar “logo depois” com armas, objetos, instrumentos, ou papeis que façam presumir ser “ele” o autor da infração. O que permite o seu enquadramento nos ditames da prisão em flagrância é tão-somente a posse desses materiais, supostamente utilizados no evento. Nesta fase, tanto o condutor como o delegado devem ter muita cautela para alcançar o verdadeiro autor. Assim, requer muito esmero no manejo do poder discricionário a fim de não se cometer equívocos. É justamente por essas razoes que a prisão nesta fase não aporta carga probatória. São apenas indícios circunstanciais, resquícios do delito, os quais, por si só, nunca funcionariam como provas para condenação. A finalidade primordial da prisão em flagrante é evitar a fuga do indiciado. Contudo, se forem preenchidos os requisitos para concessão de liberdade provisória, isto é, ausente qualquer dos subsídios do art. 312 CPP, acerca da prisão preventiva, a prisão em flagrante deve ser relaxada, mormente quando se dá nas hipóteses de flagrante impróprio ou presumido. Se ocorrer quaisquer dos pressupostos acima descritos, não há o que se falar em prisão em flagrante. O reconhecimento por vitima e testemunhas, a aproximação de pessoas sobre quem recai os subsídios da prisão em flagrante, bem como “meras suspeitas” não autorizam a medida cautelar. No caso de recaírem indícios sobre determinada pessoa, mas não se verificando restritamente os eventos supracitados, o mesmo pode até ser indiciado, mas não preso. Se por ventura a autoridade policial determinar a prisão de alguém, baseando-se em suspeitas, reconhecimento de testemunhas, aproximação com pessoas suspeitas, ou até que esteja em flagrante, sem que o mesmo também assuma as condições acima descritas, implica constrangimento ilegal e a prisão deve ser imediatamente relaxada pela autoridade judiciária. Os requisitos para validade Será lavrado o auto de prisão em flagrante e emitida nota de culpa, devendo obedecer ao prazo de 24 horas. Aliás, o famigerado prazo de 24 horas no qual o delegado pode prender “qualquer suspeito”, conforme sua conveniência, é o prazo para ele emitir a nota de culpa. Esse “prazo” do suspeito não existe no nosso ordenamento jurídico e é fruto da ignorância ou má fé de algumas autoridades policiais. O prazo de 24 se refere à nota de culpa. Nada mais. O auto de prisão em flagrante deve conter a assinatura de duas pessoas que presenciaram a prisão ou a apresentação à autoridade policial, podendo ser os próprios policiais. Em se tratando de prisão em flagrante presumido, a autoridade carcerária lavrará o auto de apreensão de todos os objetos aprendidos em posse do acusado, sendo que lhe é defeso, sob pena de falsificação ideológica, acrescentar material que não foi encontrado em posse dele ou excluir material com o qual ele se encontrava. Conclusão Se não forem observados com rigor estes requisitos, a prisão é considerada ilegal e deverá ser imediatamente relaxada.
Fonte Apriori.com.br