quarta-feira, julho 30, 2008

Julgamento da Ação sem a Citação do Réu


Julgamento liminar de improcedência, sem citação do réu 21/5/2008José Maria Tesheiner - Professor de Direito processual civil na PUC/RS; Desembargador aposentado do TJRGS
Há quem não goste do artigo 285-A, do Código de Processo Civil, que autoriza a rejeição liminar do pedido, ainda antes da citação do réu, quando no juízo já houver sido proferida sentença de improcedência em outros casos idênticos.
Penso, porém, que não apenas se deve acatar essa regra, que nada tem de inconstitucional, mas ir além, interpretando-a extensivamente, para admitir sentença liminar de improcedência, em casos de manifesta improcedência do pedido.
Desatino? Loucura? Desvario?
Não. Apenas a revelação de uma virtualidade1 de nossa lei processual, ainda não explorada.
Estabelece o Código de Processo Civil que a petição inicial deve ser indeferida, quando for inepta, considerando-se como tal a que contiver pedido juridicamente impossível (art. 295, I, e seu parágrafo único).
São exemplos de pedido juridicamente impossível: o de condenação no pagamento de dívida de jogo, de prisão do devedor por dívida cambial, de usucapião de terras públicas e o de adimplemento de contrato ilícito, como o de compra e venda de cocaína.
Ora, há muito observou Cezar Peluso, que a expressão “impossiblidade jurídica do pedido” dissimula a verdadeira natureza do fenômeno, que é o de improcedência prima facie (STACSP, 81:283).
A diferença é que, quando escreveu, ainda não se admitia rejeição liminar do pedido por improcedência manifesta, salvo quando constatada, desde logo, a prescrição ou a decadência (art. 295, IV).
Isso mudou com o artigo 285-A, porque, agora, nosso Direito expressamente admite rejeição liminar do pedido, sem citação do réu, por improcedência prima facie.
A impossibilidade jurídica permitia antes apenas a decretação de carência de ação; é de se admitir, agora, julgamento liminar de improcedência.
Por que não proferir, desde logo, julgamento de mérito e para que citar o réu, quando às escâncaras se impõe a
rejeição do pedido?
Em casos tais, dever-se-á dar ciência ao réu apenas do trânsito em julgado da sentença, para que possa eventualmente opor a objeção de coisa julgada.
Se, inconformado com o julgamento liminar de improcedência, o autor apela, aí sim é necessária a citação do demandado, para responder ao recurso (art. 285-A, § 2º).
Ao tribunal será dado, então, confirmar ou cassar a sentença. Não poderá reformá-la, para acolher o pedido, porque o réu foi citado para responder ao recurso, e não para contestar a ação (art. 285-A, § 2º). Não poderá o tribunal aplicar-lhe a pena de revelia, caso haja preferido não oferecer contra-razões, nem presumir que não tenha fato impeditivo ou extintivo a opor.
A sentença de rejeição liminar do pedido produz coisa julgada material. Nisso não há sequer novidade, porque isso já ocorria antes, nos casos de decretação liminar da prescrição ou da decadência. Nem se diga que o réu ainda não era parte e, por isso, não poderia ser beneficiado pela sentença (art. 472). O réu é réu porque contra ele foi formulado o pedido, e não porque citado. É réu desde a propositura da ação, tanto que medida liminar pode ser deferida e executada antes mesmo da citação.
Bem aplicada, a norma do artigo 285-A impedirá tramitação inútil de muitos processos. Mal aplicada, poderá ocorrer que o Supremo Tribunal Federal, ou o Superior Tribunal de Justiça, acolhendo recurso do autor, venha a determinar o processamento da ação. Ter-se-á, então, perdido anos, numa fase preliminar, anterior à própria contestação.1 Observe-se que não estou a afirmar que assim é (em ato) nosso sistema jurídico, para o que seria necessário que houvesse decisões nesse sentido. Estou apenas a apontar uma potencialidade nele contida.

Fonte: Site NotaDez

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